Sinta la cocrância...

/tati prado

Eu ainda estou me acostumando com essa ideia da blogagem coletiva e com o hábito de publicar. Só que desta vez não há como ficar quieta (tudo bem, em muitas vezes eu não calo a boca lá na lista, mas aqui no site é diferente).

O mês de novembro não foi fácil pra MetaReciclagem. O nosso grande exemplo de nomadismo levou a fundo suas ideias e ganhou a liberdade de uma vez por todas. Nós ficamos aqui... com muitas sensações misturadas, da surpresa à tristeza, tendo que encarar o desafio da transcendência.

Ao mesmo tempo em que pode ser muito “simples” falar do dpadua, também não é. A simplicidade combina com leveza. Alegria leva à plenitude. E só. Bastaria, a princípio. Por outro lado, sua presença inspiradora trouxe tantas contribuições às pessoas que compõem a rede metarec e ao universo da cultura digital, que fica complicado saber por onde começar.

Por este motivo vou me valer de uma mensagem que havia escrito em 25 de novembro, durante uma discussão na lista, mas deixei de enviá-la. O mote era a presença-permanência do Daniel Pádua na wikipedia.

A primeira coisa que me chamou a atenção foi o fato desse tema ter surgido na mesma thread em que a Yaso, sua companheira, tinha anunciado sua partida prum mundo que não conhecemos. Eu precisei separar os assuntos e começar outra, pois o fato do verbete ter sido apagado e depois colocado em votação para eliminação não me parecia algo “simples”

Pra mim, o problema maior a ser discutido não era o contexto da wikipedia em si ou apenas. A questão era muito mais ampla, se relaciona com memória coletiva, patrimônio imaterial, formação de vínculos e relações mediadas pela tecnologia, potencial das redes, ação política, etc. e, principalmente, com a condição humana mais “democrática”: a finitude. Algo difícil de compreender, sobretudo no mundo contemporâneo, em que os processos, as possibilidades, a liquidez, a simultaneidade estão em evidência, em detrimento das coisas acabadas e definidas. Nessa horas dá pra perceber o quanto somos “modernos” - o fim e a ruptura existem, sim. E incomodam.

Incômodo é uma boa palavra pra caracterizar a minha sensação ao ver a discussão sobre a wikipedia rolar nas duas threads e invadir uma terceira. Ficou evidente que nós, enquanto rede, temos muito a aprender para criticar, provar e construir sem atacar ou agredir. A gente frequentemente se atrapalha quando vai defender os ideais, perde a “razão” (por favor, evitem interpretar isso como oposição à emoção ou sensibilidade, pois estamos no século XXI) e a força dos argumentos se esvai. Seria compreensível nas situações extremas. A morte e a vida são exemplos deste tipo. Mas o fato é que o ambiente da lista de discussão vira e mexe se revela imaturo pras grandes discussões, não apenas nos casos extremos. E, pra mim, em alguns momentos parece que as pessoas se orgulham disso porque acreditam que assim estão lutando. Em certos casos causa vergonha porque nos agarramos às pequenezas de um jeito que faz parecer inócua qualquer estratégia para a libertação do ego e a evolução humana (na minha opinião, condição mínima para promover a transformação social - uma expressão que está em nossa home, caso alguém não tenha reparado).

Deixei de enviar a tal mensagem por alguns motivos. Não queria personalizar a discussão, convencer ou ofender ninguém. Me faltou energia para fazer isso com a habilidade necessária. E o pior, fiquei irritada ao imaginar que tamanha generosidade, serenidade e perspicácia bem humorada do dpadua não seriam suficientes para que a gente, enquanto coletivo (a essa altura do texto, espero que tenham percebido que não estou acusando alguém específico ou tampouco me eximindo da responsabilidade. Explicito: me refiro a nós – Rede MetaReciclagem), se expressasse de outro modo, mais sábio. Pelo menos uma vez queria que os interesses políticos não se sobrepusessem à questão maior: a vida, que o respeito, a gentileza e a delicadeza fossem a opção, que fôssemos inteligentemente críticos para não achar que só a metarec vale a pena e nenhuma outra iniciativa é genial o bastante. 

Continuamos iguais (ou quase?). Ainda não sei.

Dizem que a vida continua. Já sei.

Eu só quero mesmo é continuar otimista e acreditar que a gente pode se tornar pessoas melhores a cada dia. Mas não entendo porque desperdiçamos oportunidades preciosas. Se não aprendemos nestas situações extremas, vai ser quando, hein?

Sei lá...

Bom, a mensagem era mais ou menos essa:

[o principal motivo que me leva a escrever esta mensagem é tentar dizer a mim mesma o que é preciso fazer agora... pensar pralém do "contexto wikipedia"... ]

eu acho que as homenagens ao dpadua foram feitas.
não foi por acaso que as pessoas se reuniram à distância para celebrar sua ausência presente. uma festa "distribuída-em rede". música em sp, em brasília... lenços, camisetas e afins...
essas homenagens vão continuar acontecendo sempre, a cada vez que uma ideia sua for revisitada e reinventada, um sorriso/momento compartilhado saltar da memória ou uma frase sua for citada.

a wikipedia ou qualquer outro lugar não vai ser suficiente para "acomodar" o dpadua. nem mesmo os espaços metarec. porque registrar é também uma forma de "congelar". ideias são "catalisáveis" e “catalisadoras”, ultrapassam essa dimensão "estática".
essa figura querida tinha lá suas predileções pelo que é etéreo. por isso, numa perspectiva bem radical, acho que o melhor jeito de homenageá-lo seria "tirá-lo" de todos os lugares pra garantir sua presença fluida e livre. seria o extremo da conexão sem mediação, feita apenas por informação-energia.

por outro lado, quando penso neste "desaparecimento", significa sonegar a outras pessoas a oportunidade de conhecê-lo. conhecer suas ideias e realizações é importante para o movimento que ele tanto defendeu. as pessoas fazem a história enquanto vivem e entram pra história quando morrem. qdo isso acontece, seu compromisso com o coletivo é o que se destaca.

é este o motivo que me faz acreditar que documentar é preciso. assim como navegar é preciso.

E segue o fluxo...