Os papers de Daniel Hora

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Faz algum tempo que Daniel Hora havia compartilhado um artigo que seria apresentado no RUMOS, e recentemente compartilhou sua nova produção para o FILE. Daniel falou com o MutGamb sobre os dois trabalhos.

 

Como surgiu a proposta de escrever os artigos?

Daniel - O artigo "Multimodalidades e transversalidades da arte_hackeamento" é um resumo dos

resultados obtidos na investigação realizada durante o curso de mestrado em Arte Contemporânea, que realizei na Universidade de Brasília. Foi produzido como contrapartida ao prêmio de apoio à pesquisa que recebi do programa Rumos Arte Cibernética do Itaú Cultural, na edição 2009-2011. O texto faz a síntese de uma aproximação entre cultura hacker e produção de arte, com exemplos de artistas, ativistas e coletivos.

Já o artigo "Reprogramabilidade tecnológica, cultura hacker e suas implicações para a filosofia da arte" reflete o início de minhas investigações para tese de doutorado em Arte Contemporânea, que estou desenvolvendo também na Universidade de Brasília. Uma vez feita a aproximação inicial entre hackerismo e arte, parto agora para questões no campo da filosofia da arte: de que modo a ética hacker afeta a estética da arte e vice-versa? Como a produção de uma arte hacker se agencia no contexto artístico e cultural contemporâneo? Quais os efeitos sociopolíticos desse agenciamento? Essa reflexão está pautada pelos conceitos de produção da diferença, dissenso e programabilidade das mídias.

 

Como escolheu trabalhar com esses temas?

Daniel - Por volta de 2006, quando escrevia como jornalista e cobria a produção em artes visuais em São Paulo, surgiu um interesse pela gambiarra, como tática de produção inventiva e contra-hegemônica, em que se busca independência tanto em relação à precariedade, quanto em relação à abundância econômica e material. O contato com as pesquisas realizadas na Universidade de Brasília no ano seguinte fez com que eu ajustasse meu foco para a produção em arte e tecnologia. Assim, retomei o tema da cultura hacker, com o qual já havia lidado na conclusão da graduação, com a realização de uma grande reportagem sobre a rede Napster e seus efeitos sobre a música. Desde então, desdobro essa temática hacker e sua relação com a arte baseada nas mídias, sobretudo, digitais.

 

Como você enxerga o fato das redes estarem produzindo conteúdos e estéticas efervenscentes, mas que ainda são pouco documentas no mundo acadêmico?

Daniel - Acho que existem neste descompasso dois aspectos interligados de uma relação de simbiose: um diz respeito a uma distinção entre campos culturais e outro reflete um desajuste entre tempos. Por um lado, o campo acadêmico deriva de um histórico com raízes monásticas e medievais, em que valores elitistas vão se diluindo devagar nas aspirações de democratização. Deriva daí uma oscilação entre o olhar para o próprio umbigo e atenção para outras possibilidades de saber, fazer e sentir. Por sua vez, o campo das redes ganha evidência em um período mais recente, ainda que seja possível pensar sua existência desde épocas mais remotas. Sua flexibilidade, espontaneidade e organização predominantemente horizontal certamente contrastam com a estrutura universitária. Não sei se haveria no futuro próximo um ponto de convergência e absorção total entre esses dois mundos. Mas parece uma tendência que os contatos entre esses circuitos se tornem cada vez mais constantes. Compartilho com a expectativa de que esses contatos resultem em instâncias livres e produtivas.

 

Você acredita que ainda existe (em outras áreas e não só nas artes e comunicações) preconceito da cena hacker?

Daniel - Não diria preconceito, mas sim conceitos divergentes. Trabalhar com o termo hacker é difícil por isso, pois há modos diversos de compreendê-lo, até mesmo dentro da própria cena hacker ao longo de sua história. Em todo caso, o sensacionalismo e as versões que reivindicam alguma exclusividade seriam os piores problemas, quando a palavra hacker é distorcida como adjetivo de condenação de cibercriminosos, ou quando serve para romantizar o heroísmo da inovação e da rebeldia padronizada.

 

Como você definiria a cultura hacker? Como enxerga ela em outras áreas?

Daniel - Uma vez que existem várias interpretações, talvez possa articular a minha própria interpretação. Acho que a afirmação da cultura hacker é inseparável das tecnologias da informática e telecomunicações. Primeiro, isto tem a ver com a origem social dos grupos identificados como hackers aqueles que são adeptos da liberdade de programar e montar aparatos computacionais, com entusiasmo e prazer, desde os anos 1960. Em segundo lugar, o vínculo tem a ver também com a difusão da abordagem hacker por meio do uso das tecnologias influenciadas por esse interesse libertário, cada vez mais pervasivas no cotidiano. Por isso, seria aceitável pensar que a cultura hacker já é aplicada a outros "suportes", na biologia, na política, no design, nas artes. E é interessante notar ainda que essa abordagem, muitas vezes, recupera ou eleva o valor de práticas de ação direta, artesania e saberes tradicionais que fazem parte de outros campos.