/maira begalli
Era 2002, Tainá, a menina-índia que havia nascido em 26 de janeiro de 2001, ou seja, havia quase 2 anos, crescia. Viva a alguns quilômetros do lugar que foi considerado “a primeira vila” de uma terra tupiniquim. Do seu quarto, quando deitada no berço, podia ver um morro de mata nativa intacto, e um sol poente laranja intenso, incandescente.
Era 12 de outubro daquele ano, e eu havia tomado muito sol. No final da tarde, sentia frio. Vestia uma blusa branca, uma saia azul, andava em uma bicicleta azul com estrelas fluorescentes. Segui sem rumo, livre. Acreditava que aquilo era a liberdade. Meu cabelo crescia, fazia um ano que o havia raspado todo, queimado assim um passado que não me pertencia mais.
Antes da noite chegar, subi ao andar mais alto do prédio. Tainá dormia. Sua mãe me mostrou o mar daquele alto lugar, sublime. Me disse que gostaria de levá-la brincar na Roda Gigante, no verão do ano seguinte. Naquele momento, aos 18 anos de idade, percebi que ainda era criança e que talvez desejasse ser para sempre.
Passou um ano, em outubro de 2003 a mãe de Tainá faleceu. Coincidentemente, nunca mais a Roda Gigante esteve em frente ao prédio. Conta a lenda que A mãe guarda o desejo de brincar com Tainá, na eternidade, junto com o smog da madrugada que cobre o mar todos os dias antes do dia virar dia, quando todos os pássaros brancos se encontram sobre as rochas no canto-fortaleza.
Desde então, todo dia 12 de outubro Tainá sonha com as luzes intensas de uma Roda Gigante alocada na areia, em frente ao prédio alto. Um sonho absurdamente real. Do alto da Roda, Tainá pode avistar as luzinhas dos navios no mar e sentir a presença de sua mãe.