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Por conta de alguns movimentos recentes, mas ainda seguindo uma obsessão que já dura sete anos, tenho conversado bastante sobre a MetaReciclagem nas últimas semanas. Orlando trouxe uma imagem interessante - o reacesso - que com certeza faz bastante sentido para mim. No processo de coleta e compilação do História da / Histórias de MetaReciclagem, uma das coisas mais importantes para mim foi poder revisitar hoje - com um pouquinho mais de experiência - as ações, ideias e insights do passado, minhas e nossas.
Tem um aspecto obviamente constrangedor: eu certamente não escreveria algumas coisas, não tomaria algumas decisões, e colocaria algumas coisas de modo diferente hoje em dia. Mas também traz a possibilidade de aplicar uma perspectiva histórica - afinal sete anos não são tão pouco tempo - e entender como as ideias se desenrolam e desenvolvem com o tempo. Essa dobra ajuda a trazer novas possibilidades para o futuro, ao passo que também segura um pouco a megalomania (hm, ok, não segura muito não).
Certamente, todo o processo de coleta de material para aquela compilação histórica da MetaReciclagem foi influenciada pelos projetos, ações e leituras com os quais me envolvi nos últimos anos, e também certamente o reacesso de todo esse material influencia o que eu vou pensar, escrever e articular hoje em dia sobre redes. Nesse sentido, o processo de desenvolvimento da infralógica da MetaReciclagem é totalmente influenciado pelo reacesso. Mas acho interessante ir além disso: não só o reacesso, mas também a reiteração e reforço de imaginário.
Ontem, às vésperas do Dia da In(ter)dependência, uma tuitada minha foi parar na rede MetaReciclagem. Eu duvidava um pouco dos resultados efetivos da blogagem coletiva de hoje. Orlando, Mariel, Dani e Teia comentaram. Em especial me provocou o que a Dani falou: "'rede' é uma coisa que se sustenta muito além daquilo que as pessoas tentam escrever sobre rede". Tenho certeza absoluta disso, mas existe também uma contra-influência: aquilo que as pessoas tentam escrever sobre redes não serve apenas para dissecar e analisar as redes, mas também influencia decisivamente seu desenvolvimento, em especial no caso de tentativas situadas de conceituação, o que é frequente na MetaReciclagem.
Nas últimas semanas, comentei algumas vezes com diferentes pessoas que metade da MetaReciclagem é ficção. Não que seja mentira, mas certamente o discurso que foi construído em torno da rede tem muito de recorte esperançoso, interpretação otimista e, obviamente, um aspecto de criação de mitos (que ecoa à exploração sobre Metamitogênese, nunca tão explicitamente articulada mas ainda assim bastante presente), e isso acaba mexendo com o modo com que as ações se desenvolvem. Paradoxo do real e agenciamento coletivo, diriam Hernani e Dalton. Nada de inesperado.
Ainda assim, a satisfação ao ver que esse tipo de construção de discurso acaba por influenciar positivamente a compreensão e a consequente vivência de rede que acaba sendo possível é difícil de explicar. Raquear a realidade - fazer as pessoas acreditarem na construção colaborativa e por causa disso começarem a agir de forma mais colaborativa.
É aí que aparece mais uma dobra: no último encontrão de MetaReciclagem, eu comentei que para que a rede existisse era necessário que as pessoas conversassem mais, cotidianamente, sobre tudo o que fazem. Essa opinião não é totalmente sincera: tenho certeza de que se as conversas forem intermitentes e incompletas, ainda assim a rede continua se formando potencialmente a cada instante. Mas é meu papel (ficcional? dramático? regra do jogo?) pregar a documentação, a conexão e a construção em rede, e influenciar mais pessoas a agirem dessa forma.
Isso acaba me dando uma visibilidade desproporcional. O efetivo desenvolvimento da MetaReciclagem como rede também requer a influência de alguns profetas silenciosos e feiticeiros na fronteira, mas por conta da própria natureza do papel que assumem, eu apareço mais. Somos - documentadorxs, praticantes, articuladorxs, técnicxs - interdependentes, em um nível de complexidade que evita que as coisas percam a graça tão rápido. Talvez seja possível uma redação alternativa à definição mais recente da MetaReciclagem: um jogo de interdependência. Bom para me lembrar que a rede é muito maior do que aquilo que nós - documentadorx, comunicômanos e remitificadores - conseguimos apreender, e para dar uma certa tranquilidade de que o futuro ainda reserva muitos assuntos para a gente entender, relatar e reinventar. Espero que os outros papéis do jogo ainda tenham desafios como a gente. O caminho é longo e muito divertido. Vamos?