Sganzerla por Bruno Tarin

Bruno Tarin fez um texto sobre o a obra de Sganzerla. Nele, Bruno comenta a atualidade das questões abordadas enquantro homenageia o filme lançado recentemente.

 

 

Assim como Orson Welles, Sganzerla era obcecado pela magia e pela figura do mágico. O mágico, pode-se dizer, é um tipo de ator mas com características bem específicas, enquanto a dramaturgia e a arte da atuação se propõem a produzir mentiras que levadas aos seus limites se tornam críveis, verossímeis mas nunca uma realidade (um dos jogos da atuação no teatro clássico é o fato do público aceitar entrar num universo fictício), o mágico se propõe a fazer o caminho inverso: partindo da realidade este produz uma mentira mas que de tão bem executada produz uma dúvida, a dúvida se aquilo aconteceu de verdade ou não, se o impossível é possível e verdadeiro. O mágico assim cria muitas verdades ao mesmo passo que questiona todas elas, sendo por excelência, aquele que é capaz de sem consentimento produzir uma nova realidade, uma nova verdade. Se ele não realiza isso então não conseguiu atuar. O mágico, pode-se dizer, é capaz de como Deleuze propõe, afirmar a verdade da relatividade e não a relatividade da verdade. Ou como dizia o próprio Sganzerla se mais de duas pessoas acreditam numa mesma coisa então já é mentira. A verdade assim é colocada como a singularidade, a diferença, em suma a perspectiva. Perspectiva essa que só pode emergir de uma situação de liberdade, o mágico não pode forçar alguém a ver verdade em seus atos, assim como não pode forçar ninguém a produzir uma verdade. A liberdade de produzir seu próprio ponto de vista (verdade) é primordial para que toda mágica aconteça. Não seria assim também na democracia?

 

O texto original pode ser acessado aqui.